quarta-feira, novembro 07, 2007

O Retrato do Artista Enquanto Luminovive

Abre as narinas e sente o cheiro fraco e sonoro que brota vaga e pesadamente do chão e logo se espalha.
Estica as mãos para ver se ao tato ainda resta um último toque antes do adeus final que leva tudo para longe e te abandona num vazio cheio de ausência e destatificação.
Abre os olhos para contemplar sem lágrimas e sem lagos tua sedenta alma lamacenta que preenche os espaços vazios de teu corpo. O domínio da alma; beatificação.
Abre por fim teu peito como duas cortinas e deixa entrar a luz que a boca não quis. Porque luz não tem som nem gosto. Deixa a luz e a recebe de uma única e completa vez.

Não haverá mais espaço para riso, nem torres brancas, nem sacrifícios monumentais a Deus.
Não haverá rebanhos de cabras lanosas e balidentas cheias de leite e carrapatos. Não haverá planície gentil e graminiverde para receber teus cansaços, nem haverá repouso para teu descanso.
Não haverá rezas a ti nem ao teu Deus interior que mora em teu estomago e que reclama a terça parte de tudo que comes e pensas. És um ateu de ti. Não haverá redenção.

Mas calma teu luminoso peito. Não haverá vida para ti, mas há dor e torção de músculos.
Há um inferno luminossanto que também é parte da luz de teu céu.
Calma teu luminopeito que há morte depois da morte e desacontecimentos para te ocupar.
Que para ti não sobrou nada além da recompensa.

Que se não sobram terras sobram em cemitérios teu prêmios.
Cheios e mornos cemitérios para tuas mil mortes, para tuas dez mil dores e tuas duzentas mil farsas.

Há terra quentefofaberta para ti.
Madeira úmida e vegetal.
Repousa teu nome no mármore e teu corpo na morte.

Tito de Andréa

sábado, novembro 03, 2007

Reencarniviver

Será cheio de vida e morte e pulsará e cortará a todos. Em meu peito que bate e debate uma antiga música retumbante. Meu peito que é como uma bomba que vai explodir e lançar pedaços de osso em todas as direções. Tudo é mais belo quando está repleto de sal e sangue.

Em meu peito que é que vive o inicio.
Nele é que deita a vida quando quer morrer.

E é tudo que eu tenho para dar para qualquer um que me pedir algo.
Sempre as mesmas palavras colocadas em ordem diferenciada para dizer sempre as mesmas anti-idéias. Contravisões; árvores com raízes para o alto.

E é tudo que eu tenho para depositar aos teus pés rudes e feitos de barro.
É tudo que eu tenho para ofertar.

Será cheio de lágrimas, suor e força. Será grande e grandioso como deve ser; será.
E será alto e soará a todos que ouvirem como o anuncio dos novos dias.
E arrancará de todos que tiverem olhos para ver e tato para sentir um irremediável pedaço.
Uma ferida que não sara, será.

E é tudo que eu posso ser e fui. As cordas que atam as mãos. Os pregos que prendem o mastro, as correntes que amarram a fera.
E é tudo que eu pude sonhar e sonhei.
Um mártir de si.
Um passo e um salto.
Um vôo e uma queda.

Uma vida e outra e mil enfim.

Tito de Andréa